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COMO CONSTRUIR UM BURACO NEGRO

Buracos negros são alguns dos objetos mais estranhos em nosso universo. Para criar um, precisamos tanto da relatividade geral quanto da mecânica quântica. Vamos mostrar como.

Em um próximo texto, nós discutiremos a verdadeira natureza de buracos negros. Nós falaremos deles como entidades relativísticas, como regiões do espaço-tempo cuja curvatura da fronteira efetivamente remove seu interior do nosso universo observável.

Estas são algumas ideias abstratas. E realmente, buracos negros eram, inicialmente, apenas uma estranha construção da relatividade geral. E, apenas porque algo existe na matemática, não implica que precise existir na realidade.

Então, buracos negros são reais? >> A resposta é sim. <<

Buracos negros são realidades astrofísicas para as quais nós temos vasta evidência. Para realmente formar um buraco negro, contudo, as descrições de Einstein de massa, energia e espaço-tempo não são suficientes. Nós precisamos de mecânica quântica. Se você estiver disposto a isso, vamos construir um buraco negro.

Primeiro passo: ache uma estrela muito maciça, e espere. Deixe-a assando – não por muito tempo, pois esses caras têm vidas muito curtas. Apenas aguarde alguns milhões de anos para a supernova. Se você ficar impaciente, pode aumentar a temperatura do núcleo bombardeando-o com ondas gravitacionais. Isso vai terminar o trabalho mais rápido. Os detalhes das mortes de estrelas maciças são muito legais.

Mas eles podem ser encontrados em muitos lugares, então nós vamos apenas ignorá-los aqui. Nos momentos finais de agonia da vida de uma estrela muito maciça, a fusão nuclear frenética e crescente em seu interior produz um elemento químico após o outro, em camadas tipo Matriosca de núcleos cada vez mais pesados que, por fim, circundam um núcleo de ferro. A formação desse núcleo representa o fim da fusão exotérmica.

Fundir dos núcleos de ferro absorve energia, não a libera. Então, sem uma fonte de energia, o núcleo da estrela colapsa sobre si mesmo. Elétrons são arremessados nos prótons do núcleo atômico, forjando uma estrela de nêutrons. As outrora colapsantes camadas externas ricocheteiam nesse centro absurdamente denso em uma explosão de supernova, enriquecendo a galáxia com suculentos elementos novos.

O núcleo remanescente, a estrela de nêutrons, é uma fera muito estranha – uma bola de nêutrons do tamanho de uma cidade com uma massa de, no mínimo, 1,4 sóis, e a densidade de um núcleo atômico. Quando conseguimos vê-las, as detectamos como pulsares. Debaixo de uma fina atmosfera de plasma uma estrela de nêutrons é uma entidade da mecânica quântica. E é um fenômeno quântico que a salva, por enquanto, do colapso final. Outro fenômeno quântico também vai nos permitir ultrapassar a barreira, criando um buraco negro.

Para entender como o espaço funciona para um objeto quântico como esse, precisamos pensar não em espaço 3D tradicional nem em espaço-tempo 4D, mas sim em espaço de fase quântica 6D. Para uma estrela de nêutrons, esse é o espaço da posição 3D e do momento 3D. E ele define o volume que pode ser ocupado pela matéria estranha em uma estrela de nêutrons. A maneira exata como a matéria de uma estrela de nêutrons preenche esse espaço de fase quântica 6D depende de dois importantes princípios da teoria quântica, o princípio de exclusão de Pauli e o princípio da incerteza de Heisenberg.

Esses dois governam o delicado equilíbrio entre estabilidade e colapso. O princípio de exclusão de Pauli basicamente afirma que duas coisas não podem ocupar o mesmo lugar ao mesmo tempo. E, por coisa, quero dizer fermion, o tipo de partícula que compreende toda a matéria tradicional. Por exemplo, elétrons, prótons e nêutrons. Por lugar, eu quero dizer localização do espaço de fase quântica. Portanto, dois férmions podem ocupar a mesma localização física perfeitamente, desde que seus momenta ou quais outras propriedades quânticas sejam diferentes.

Essa regra é o que mantém os elétrons em suas órbitas separadas e estáveis, além de ser, em parte, o que permite que matéria sólida tenha sua estrutura. No caso de uma estrela de nêutrons, o espaço de fase posição-momento está completamente preenchido por nêutrons. Todas as localizações espaciais e “localizações” de momentum conectadas a essas localizações espaciais contém um nêutron.

OK.

Alerta de jargão.

Esse estranho estado da matéria onde o espaço de fase está completamente preenchido é chamado de matéria degenerada. E a pressão de degeneração, resultante de as partículas não terem lugar algum para onde colapsarem é incrivelmente forte – suficiente para resistir inicialmente à insana força gravitacional de uma estrela de nêutrons. Até onde sabemos, é impossível superar o princípio de Pauli – não diretamente, pelo menos. Entenda, não é uma questão de força. Dois férmions simplesmente não podem ocupar o mesmo estado quântico.

Simples assim.

Então a estrela de nêutrons está segura.

Mas vamos lá!

Nós queremos construir um buraco negro!

Felizmente, existe outro fenômeno quântico que nos permite burlar o princípio de Pauli: O princípio da incerteza de Heisenberg nos diz que as propriedades de uma entidade quântica são fundamentalmente incertas. Os detalhes podem ser tópico de outro texto, mas, em resumo, a mecânica quântica descreve a matéria como uma distribuição de possibilidades. Certas propriedades numéricas que você pode assinalar a uma partícula existem em uma onda com variados graus de “talvez”. Localização é uma dessas propriedades. Um nêutron, por exemplo, não está em um local apenas mas sim, existe como uma nuvem de possíveis localizações que podem estar fortemente restritas ou podem estar muito espalhadas. A localização permanece uma nuvem de possibilidades até que o nêutron interage com outra partícula, momento no qual sua localização é determinada.

Esse é o aspecto mais estranho e mais legal da mecânica quântica. E vamos tentar trabalhar a ele em outro texto. Mas, por enquanto, temos um buraco negro para fazer. O princípio da incerteza de Heisenberg nos diz que certos pares de quantidades: posição e momentum, ou tempo e energia, precisam, quando combinados, conter um grau mínimo de incerteza. Se um está rigidamente definido, então o outro deve ser incerto, e se espalhar por uma vasta gama de valores potenciais. Uma estrela de nêutrons é composta da matéria mais densa no universo. Seus nêutrons constituintes estão tão restritos em posição quanto é possível estar.

O princípio de Heisenberg, portanto, nos diz que eles devem ter momenta altamente indefinidos. Velocidades muito, muito altas dos nêutrons se tornam parte do espaço de possibilidades. Para colocar de outra forma, os nêutrons estão empacotados tão próximos no espaço de posição que seus espaços de momentum tornam-se gigantescos. O espaço de fase se expande. E aqui está a coisa: quanto mais densa a estrela de nêutrons se torna, mais espaço de momentum se tem. Então Heisenberg nos permite contornar aquela incômoda pressão de degeneração. Se nós pudermos de alguma forma adicionar mais matéria a uma estrela de nêutrons – coloque outra estrela próximo dela, talvez – ela não se tornará espacialmente maior. A matéria extra certamente precisa de algum lugar para ir. A estrela precisa se expandir. Mas ela não se expande em espaço de posição. A estrela se expande em espaço de momentum. Em espaço de posição, ela na verdade fica menor. Quanto mais matéria na estrela de nêutrons, menor é seu raio. Esse é um efeito quântico, mesmo que esteja acontecendo na escala de uma estrela. Até agora, a estrela de nêutrons tem pairado sobre um tamanho crítico. A curvatura do espaço-tempo na superfície da estrela é muito extrema. Relógios correm notoriamente mais lentos. E as densidades no interior da estrela produzem estados de matéria muito estranhos.

Apesar disso, contudo, a estrela ainda é, basicamente, uma coisa neste universo. E, apesar disso, abaixo da superfície da estrela paira o horizonte de eventos potencial, a superfície de dilatação temporal infinita. O horizonte não existe realmente enquanto a estrela de nêutrons permanecer maior do que o horizonte potencial. Contudo, se pudermos aumentar a massa da estrela, ela irá encolher, e o horizonte de eventos potencial se expande. Você pode ver onde quero chegar com isso. Existe uma massa na qual o raio da estrela de nêutrons e o horizonte de eventos se sobrepõem. É 3 vezes a massa do sol. Nesse ponto, o horizonte de eventos realmente passa a existir. E a estrela de nêutrons submerge abaixo dele. Nós finalmente criamos nosso buraco negro. Mas o que acontece com a estrela quando ela desliza para abaixo de seu horizonte de eventos?

Tudo no interior é perdido deste universo. O espaço-tempo é radicalmente alterado dentro da estrela com todas as geodésicas, caminhos no espaço-tempo, apontando para dentro em direção ao centro. No momento em que o buraco negro se forma, o material em seu interior deve lembrar a matéria da estrela original. Mas nada pode impedir o colapso final.

Todos os caminhos levam ao ponto central de curvatura infinita, a >> singularidade <<.

Do ponto de vista da própria estrela, a cascata para dentro acontece. Todo o espaço de posição colapsa em direção à singularidade. O espaço de momentum se expande de acordo, com as correspondentes velocidades enormes, todas apontando para o centro. Os nêutrons são certamente quebrados em seus componentes: quarks e gluons. Mas o que acontece com esses a medida que a estrela se aproxima de um ponto infinitesimal, da escala de Planck? A física ainda não pode nos dizer. Do ponto de vista de um observador externo – ou seja, nós – isso nunca acontece. O buraco negro se forma. O núcleo estelar se torna escuro. Mas em nossa linha do tempo, nada jamais acontece novamente abaixo do horizonte de eventos.

Não é possível consistentemente pensar sobre o que acontece agora. Abaixo do horizonte, não existe um “agora” correspondente. O material da estrela, e todos os eventos que aconteceram a ele não são mais parte da linha do tempo do universo exterior. Em nosso relógio, a singularidade se forma no futuro infinitamente distante. Para nós, existe apenas o horizonte de eventos. É dessa forma que um buraco negro astrofísico real é criado.

A massa do núcleo estelar se torna a massa aparente do buraco negro. E pouquíssimas propriedades do material colapsado são lembradas. O buraco negro retém massa, carga elétrica e rotação. E essas continuam a influenciar o universo exterior, as vezes de maneiras muito importantes. Obviamente, um buraco negro real não é a entidade estática que é descrita as vezes na teoria. Eles crescem. Eles vazam. Eles mudam.

Nós vamos chegar ao que isso significa, para buracos negros e para o universo, em outro texto.

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